Órgão julgador: Turma Cível, unânime, rel. Des. James Eduardo Oliveira, j. em 29.4.2015).
Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006
Ementa
RECURSO – Documento:7079956 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5078747-19.2024.8.24.0930/SC DESPACHO/DECISÃO M. G. H. A. interpôs APELAÇÃO contra a sentença proferida nos autos da ação revisional, que tramitou no Juízo de Direito da Unidade Estadual de Direito Bancário, na qual foi julgado procedente o intento autoral, com a ordem para redução dos juros remuneratórios à média de mercado, bem como a condenação da ré na repetição simples do que foi pago em excesso. A apelante aduz que os juros de mora incidentes sobre a indenização por dano material devem fluir a partir de cada desembolso, e que os honorários sucumbenciais comportam majoração. Ao fim, postulou o afastamento da ordem de expedição de ofício ao NUMOPEDE.
(TJSC; Processo nº 5078747-19.2024.8.24.0930; Recurso: recurso; Relator: ; Órgão julgador: Turma Cível, unânime, rel. Des. James Eduardo Oliveira, j. em 29.4.2015).; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7079956 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5078747-19.2024.8.24.0930/SC
DESPACHO/DECISÃO
M. G. H. A. interpôs APELAÇÃO contra a sentença proferida nos autos da ação revisional, que tramitou no Juízo de Direito da Unidade Estadual de Direito Bancário, na qual foi julgado procedente o intento autoral, com a ordem para redução dos juros remuneratórios à média de mercado, bem como a condenação da ré na repetição simples do que foi pago em excesso.
A apelante aduz que os juros de mora incidentes sobre a indenização por dano material devem fluir a partir de cada desembolso, e que os honorários sucumbenciais comportam majoração. Ao fim, postulou o afastamento da ordem de expedição de ofício ao NUMOPEDE.
Na sequência, CREFISA S/A – CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS interpôs APELAÇÃO aventando, de início, a nulidade da sentença por falta de fundamentação e por cerceamento de defesa porque, na sua ótica, além de faltar substância ao veredito, a aferição das abusividades ventiladas na inicial depende de dilação probatória. Incursionando no mérito, aduziu que incide o prazo quinquenal para o cômputo da prescrição da revisão de contratos e que, nessa perspectiva, ultimou-se a marcha extintiva em relação aos pactos revisados. Defendeu que a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil não pode ser utilizada como único parâmetro para aferição de abusividades. Por isso, com apego no brocardo jurídico pacta sunt servanda, asseverou que os juros remuneratórios não comportam revisão porque, além de terem sido expressamente aceitos, não revelam abusividade diante do perfil de alto risco da contratante. Pleiteou a redução do valor arbitrado a título de honorários sucumbenciais devidos ao patrono que representa a autora e, por fim, alegou que não cabe a devolução do que já foi pago.
Após apresentadas as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.
1. Somente a total ausência de fundamentação acarreta a nulidade do decisum. A economia dela, não. Se está justificada, ainda que de passagem, a revisão contratual e a mitigação da taxa compensatória, a decisão está suficientemente fundamentada, não podendo ser acoimada nula (TJSC – Apelação Cível nº 0303637-12.2016.8.24.0023, da Capital, Sétima Câmara de Direito Civil, unânime, rel. Des. Carlos Roberto da Silva, j. em 13.10.2022).
Objetivamente, "não há falar em nulidade da sentença por falta de fundamentação se dela constam as razões de decidir, permitindo o exercício do direito à ampla defesa e ao contraditório. Eventual ausência de enfrentamento, ponto a ponto, de argumentos impertinentes ou incabíveis à discussão, não a torna nula" (TJMG – Apelação Cível nº 1.0000.19.133312-9/001, de Governador Valadares, 2ª Câmara Cível, unânime, relatora Desembargadora Maria Inês Souza, j. em 04.10.2022).
2. A controvérsia invocada em grau de recurso hospeda discussão acerca da (i)legalidade das disposições contratuais pactuadas no negócio jurídico sacramentado entre as partes. A solução disso independe da produção de prova porque se trata de matéria exclusivamente de direito, de modo que a documentação arregimentada aos autos é suficiente para estabelecer vetores de orientação ao desate da quaestio.
"Longe de traduzir cerceamento de defesa, o julgamento antecipado da lide é uma exigência legal quando o cenário do litígio descortina o predomínio da matéria de direito e a suficiente elucidação da matéria de fato" (TJDFT – Apelação Cível nº 20140510043097, de Planaltina, Quarta Turma Cível, unânime, rel. Des. James Eduardo Oliveira, j. em 29.4.2015).
Indo além, "inocorre cerceamento de defesa quando o juiz, fundamentado no livre convencimento motivado, dispensa prova inútil, protelatória ou desnecessária ao deslinde da quaestio" (TJSC – Apelação Cível nº 0302656-79.2017.8.24.0012, de Caçador, Segunda Câmara de Direito Civil, unânime, rel. Des. Monteiro Rocha, j. em 5.4.2023).
Logo, sem que tenha havido afronta a qualquer dos substratos do contraditório, não se há falar em nulidade da sentença por cerceamento de defesa.
3. Na escora do entendimento sufragado pelo Superior Tribunal de Justiça, a ação de revisão de contrato bancário cumulada com pedido de repetição de indébito, por ter natureza pessoal, prescreve em dez anos (CC, art. 205) (Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.632.888/MG, Quarta Turma, unânime, relator Ministro Raul Araújo, j. em 19.10.2020; no mesmo sentido: TJSC – Apelação nº 5018557-61.2022.8.24.0930, da Unidade Estadual de Direito Bancário, Quinta Câmara de Direito Comercial, unânime, relatora Desembargadora Soraya Nunes Lins, j. em 1º.2.2024). Tal marcha extintiva, aliás, começa a fluir da assinatura do contrato (STJ – Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.966.860/RS, Terceira Turma, unânime, relatora Ministra Nancy Andrighi, j. em 13.3.2023).
Volvendo-me ao caso concreto, o pacto questionado foi entabulado em 2.5.2014 e a revisional ajuizada em 31.7.2024, o que sugere o alcance do decênio. Em 18.9.2023, todavia, Marlene havia proposto ação de produção antecipada de provas (nº 5089659-12.2023.8.24.0930).
Porque a propositura de ação cautelar preparatória interrompe a contagem do prazo prescricional, a marcha decenal não se consumou (nesse sentido: TJSC – Apelação Cível nº 0331014-26.2014.8.24.0023, da Capital, Quinta Câmara de Direito Comercial, unânime, rel. Des. Soraya Nunes Lins, j. em 9.3.2017; Apelação nº 5083058-87.2023.8.24.0930, da Unidade Estadual de Direito Bancário, Terceira Câmara de Direito Comercial, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. em 21.3.2024).
4. Pelo princípio da autonomia da vontade, os capazes podem contratar sem amarras. Entretanto, tal princípio não é aplicável indistintamente, de modo que deve-se atentar para os limites da ordem pública e da função social do contrato (CC, art. 421). De igual modo, o pacta sunt servanda, mandamento jurídico que preconiza que o acordo de vontades faz lei entre as partes, também deve ser flexibilizado a fim de inibir-se a estipulação de cláusulas que porventura desequilibrem a relação contratual, pondo o consumidor em desvantagem exagerada (CDC, art. 51, inc. IV) ou, ainda, que tornem a obrigação excessivamente onerosa para o contratante (CDC, art. 51, § 1º, inc. III) (nesse sentido: TJSP – Apelação Cível nº 1002044-39.2022.8.26.0572, de São Joaquim da Barras, Trigésima Sétima Câmara de Direito Privado, unânime, rel. Des. Sérgio Gomes, j. em 9.1.2023).
Essa linha de raciocínio ganha força na medida em que se notam disposições contratuais que vão de encontro a normas de ordem pública e de interesse social, como as previstas no Código de Defesa do Consumidor (CDC, art. 1º), as quais são inderrogáveis ainda que essa fosse a vontade dos interessados (José Geraldo Brito Filomeno, "Direitos do Consumidor", 15ª ed., São Paulo: Atlas, 2018, pág. 13).
Indo direto ao ponto, é possível, de forma excepcional, a revisão da taxa de juros remuneratórios posta em contratos de mútuo – sobre os quais incidirão as regras emanadas da legislação consumerista – desde que a abusividade fique cabalmente demonstrada, ou seja, quando o consumidor for posto em desvantagem exagerada (STJ – Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.920.112/PR, Terceira Turma, unânime, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. em 21.2.2022).
M. G. H. A. entabulou contrato de empréstimo pessoal com Crefisa S/A e, acoimando de abusivos os juros remuneratórios estipulados, busca a revisão do pacto e a mitigação da respectiva taxa.
Sabe-se que "a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade" (STJ – Súmula nº 382) e que a taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil representa mero referencial para a constatação de excessividades. É somente perante as particularidades iridescentes do caso concreto que a onerosidade do percentual compensatório poderá ser apurada. Para isso, levar-se-á em consideração circunstâncias, tais qual "o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos" (STJ – Recurso Especial nº 1.821.182/RS, Quarta Turma, unânime, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, j. em 29.6.2022).
Desvela-se do instrumento contratual sacramentado entre Marlene e Crefisa que os juros remuneratórios pactuados destoam significativamente da contemporânea média de mercado e, ainda que tenha tido oportunidade para fazê-lo, a instituição financeira não comprovou que a anabolização dos compensatórios foi pautada em concretas condições desfavoráveis para a concessão do crédito. Na verdade, a narrativa ventilada pela ré é genérica, abstrata, e, por isso, não tem o condão de justificar a incidência de taxas elevadas.
Eis a discrepância identificada:
ContratoDataJuros pactuadosMédia de mercadoSérie Bacen030400025624 (Evento 1, CONTR7)2.5.201422% a.m e 987,22% a.a5,83% a.m e 97,43% a.a25464 e 20742 - Crédito pessoal não consignado
Diante da nítida onerosidade excessiva a que a consumidora foi exposta no referido contrato, as taxas de juros remuneratórios devem ser minoradas para equivalerem à contemporânea média de mercado (TJSC – Apelação nº 5002301-06.2020.8.24.0189, de Santa Rosa do Sul, Quinta Câmara de Direito Comercial, unânime, relatora Desembargadora Soraya Nunes Lins, j. em 25.4.2024), sendo que "a procedência dos pedidos formulados em ação revisional de contrato bancário possibilita tanto a compensação de créditos quanto a devolução da quantia paga indevidamente, em obediência ao princípio que veda o enriquecimento ilícito" (STJ – Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.679.635/PR, Quarta Turma, unânime, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, j. em 10.8.2020).
5. Sobre o dies a quo do cálculo dos juros de mora que deverão incidir sobre o que Marlene faz jus a reaver, "tratando-se de responsabilidade contratual, o termo inicial de incidência dos juros moratórios é a data da citação" (STJ – Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial nº 260.183/MG, Quarta Turma, unânime, rel. Min. Raul Araújo, j. em 13.12.2018).
Logo, em conformidade com o que foi estipulado na sentença recorrida, o montante a ser restituído à autora deverá ser atualizado pela variação do INPC/IBGE, a partir do desembolso, e acrescido de juros de mora, estes a fluir da citação, no percentual de 1% ao mês. A partir da vigência da Lei nº 14.905/2024, a atualização monetária deverá ser calculada pelo IPCA/IBGE e os juros de mora pela SELIC, deduzido o IPCA (CC, art. 406, §1º c/c art. 389, parágrafo único).
6. Deve ser afastada a expedição de ofício ao Núcleo de Monitoramento de Perfil de Demandas e Estatística – NUMOPEDE porque o ajuizamento de diversas ações contra a mesma casa bancária, por si só, não revela conduta de má-fé (TJSC – Apelação nº 5079183-75.2024.8.24.0930, da Unidade Estadual de Direito Bancário, Quinta Câmara de Direito Comercial, unânime, relatora Desembargadora Soraya Nunes Lins, j. em 10.4.2025). Aliás, a instituição financeira pode, se reputar oportuno, acionar as autoridades administrativas sem a intervenção do Judiciário (TJSC – Apelação nº 5015187-82.2024.8.24.0064, da Unidade Estadual de Direito Bancário, Sexta Câmara de Direito Comercial, unânime, rel. Des. Osmar Mohr, j. em 24.4.2025; Apelação nº 5063429-64.2022.8.24.0930, da Unidade Estadual de Direito Bancário, Terceira Câmara de Direito Comercial, unânime, rel. Des. Rodolfo Tridapalli j. em 16.4.2025).
7. Os honorários de sucumbência fixados em primeira instância – R$ 1.500,00 – para remunerar o trabalho do patrono que representa os interesses da autora não são excessivos tampouco diminutos na perspectiva do disposto no §2º do artigo 85 do Código de Processo Civil, de modo que a verba sucumbencial deve ser mantida tal qual foi originalmente estipulada.
8. Desprovido o recurso da ré, majoro em R$ 300,00 os honorários recursais (CPC, art. 85, § 11), os quais, somados aos R$ 1.500,00 já estipulados, totalizam R$ 1.800,00.
À luz do exposto, conheço dos recursos e, com fulcro no disposto no artigo 932, inciso VIII, do CPC c/c artigo 132, incisos XV e XVI, do RITJSC, nego provimento ao intento da Crefisa S/A e dou provimento à pretensão recursal da autora para afastar a expedição de ofício ao NUMOPEDE.
assinado por ROBERTO LEPPER, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7079956v4 e do código CRC d270bfd2.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ROBERTO LEPPER
Data e Hora: 13/11/2025, às 19:54:15
5078747-19.2024.8.24.0930 7079956 .V4
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:46:50.
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